Meu jogo

Meu jogo favorito tem dados viciados e cartas na manga. Não hesito dizer que controlo tudo e que nada realmente existe nessa mesa. Saiba que você é parte apenas e não peça fundamental. Minha diversão pessoal soa como diamantes tocando o chão. É emocionante ver como se excita jurando ter a sorte a seu favor. Não no meu salão, aqui só eu ganho, aqui você é meu prêmio.

Suas cores

Estou vestindo aquele dourado por dentro.
Enquanto isso você colore com outras cores nossa vida. Não gosto desses tons, mas deixo você brincar.
Quando cansar, te mostro como realmente deve ser.

Eu e eu

Ao som de destruição pessoal alheia começo a procurar sentindo no que fazer comigo mesma. São tantas vontades e desejos. E eu simplesmente não sei o que fazer. Com um riso frouxo, meio sacana penso em lugares, bocas e sabores. Todos me confundem e me sinto diante de uma loja inteira de sonhos. Adoro tudo o que vejo toda vez que abro o olho e sinto muito não segurar tudo o que sai pela minha boca. Escapam palavras asperas e lamentações banais. Encaro qualquer realidade com a mesma vontade de transaformá-la. Nunca satisfeita, eu não amo, ou se amo não sei onde isso começa ou termina. Tudo fica no campo do desejo, se tem fundamento ou não, eu deixo a palavra pra quem acha que sabe de alguma coisa. Sou constantemente cambaleante em certas vidas, pedinte em outras, melancólica em alguns pequenos momentos e várias vezes sou tão perdida que acabo confundindo os passos alheios também. É divertido viver uma vida errante, é como andar na rodovia sem saber se falta muito ou pouco e se onde vou chegar vale a pena. No meio do caminho eu conheço pessoas e coleciono as preferidas. Descarto que não faz diferença e saboto as que considero interessantes. Gosto do calor de cada diálogo tendencioso e mais ainda de cada beijo não programado. Eu sei, todos devem imaginar que é dificil se relacionar com alguém como eu. Por isso poupo a todos, não faço amigos nem me lembro deles. Não tenho namorados passados e nem faço questão de me lembrar de quem um dia disse me amar. Também não me preocupo em definir o que sinto e nem o que pretendo sentir. Manipulo meus sentimentos por prazer e salvação própria. Não se preocupe em ir embora ou entrar na minha vida. Ninguém altera o que sou e dificilmente vai deixar saudade. Sou mútavel e satisfeita com isso. Sou minha melhor companhia e também inimiga em muitos casos. No fim não preciso de nada, tenho e crio o que ou quem preciso. É tão simples que parece até brincadeira.

Vida morna

O tempo entra pela casa levantando cortinas e arrastando sonhos. Brisa leve de pensamentos e lembranças que surgiram em momentos de descuido. A sala levita em tons pasteis irradiando uma pequena chama que aquece qualquer tristeza. As folhas do calendário escapam frouxas com o caminhar dos dias. Alguns botões desabrocham, algumas folhas murcham e tudo segue em sincronia. Certas canções embalam olhos cansados e corpo que se funde na poltrona que mais parece colo de mãe. Poucos movimentos e um ligeiro sorriso que aparece e some alternando seriedade e alma. É a vida que corre a passos pequenos dando a oportunidade de sabores mais intensos e momentos memoráveis.

O desejo sempre volta

Tenho dedos que querem escrever em seus vidros. Rascunhos de banhos e luas que ficaram esquecidos noites atrás. Faz um frio agradável toda vez que imagino sua cabeça perdida em algum lugar que dá voltas em torno de mim. Seja nessa vida ou na outra, ainda te vejo silencioso a me arrancar suspiros.

Uma questão de gosto

É certo que falar da tristeza alegra meu coração e falar da alegria o conforta. O engraçado é como as linhas nunca perdem o contorno do seu rosto. Todas tem algo seu para dizer. Sempre registrando banalidades, felicidade extrema ou tragédias em tempo real. Em mim vivem vulcões que constantemente entram em erupção e precisam de suporte jornalístico pra notíciar a quem eu não sei, o que se passa aqui dentro. Perco a forma as vezes ou a linha que gosto de seguir, mas encontro nas lágrimas habilidade suficiente pra colocar em palavras o que você me causa. É como uma terapia, alguém com quem conversar e fazer aquela famosa indagação "será que ele gosta de mim?". Gostaria as vezes que meus olhos não tivessem se rendido aos seus. Eu tinha pleno controle sobre mim e a minha vida antes disso. Agora sou um barco sem rumo a atravessar seus oceanos calmos e turbluentos. Seu humor é uma caixa de surpresas e minhas vontades ultrapassam os limites físicos. Tantas coisas acontecem ao longo do tempo e me sinto jovem quando deveria me sentir velha. No fim eu gosto de provar todos os sabores que você me oferece e sei que você deseja todas as noites os vários que eu tenho.

O que dizer de nós?

Saiba que por todas as idas e vindas tudo é mais vivo em mim. Com um amor sofrido e um momento curto as emoções multiplicam-se e os sorrisos valem mais que ouro. Saiba que você me faz mais mulher a cada "eu te amo" que escapa frouxo e que a cada partida sua eu morro mais uma vez para renascer de novo. Por isso é tão difícil apagar seu rosto e não querer ouvir sua voz. Porque a cada vestígio seu algo em mim se modifica. Uma expansão de esperança com felicidade, algo sem explicação. É sempre uma vida paralela, dois caminhos que anseiam pela encruzilhada. Veja como podemos nos fundir em um único desejo quando nos permitimos. Entenda que somos completos desde que resolvemos brincar de amar. Agora é cada vez mais complicado desfazer tantos nós e percebo que nem ao menos temos a real vontade de fazer isso. Impulsos dominam nossa vida que não pode ser como a de todas as outras pessoas. Vontades que se perdem em distâncias e medos que sobrevivem através das noites. No fim, com deslizes, entre erros e acertos, somos sempre um do outro. Como algo definido por alguém maior que nós, uma vontade que fica mínima com a demora e a espera, aos poucos cria vida e se torna uma obsessão. A cada chegada sua meu coração ainda vai bater mais forte, terei os mesmos calafrios e minha boca desejará a sua. Tem sido sempre assim. As vezes mais intenso, mas nunca menos. Meu carinho por você é algo que existe por existir apenas, ninguém criou e eu não forcei para tê-lo. Tudo o que vivemos é uma história e tanto eu diria. Uma forma de se viver levando em conta dificuldades e valores que hoje não se vê mais. Os amantes abandonam tudo com tamanha facilidade. Eu não permito fraqueza, nem me deixo vencer sem lutar. Enquanto eu tiver forças e ver em você algum sentimento real, continuarei aqui, guardando um lugar especial pra nós dois. No fim ninguém quer realmente saber o que acontece. É só vida a ser consumida e beijos a serem dados. Minhas lágrimas explicam mais felicidade que tristeza ao contrário do que você pensa. E elas continuarão correndo lentas pelas minhas bochechas, sempre querendo contar pra você o que já não cabe mais em mim. Vamos seguir nossos dias, com nossa vida singular até a hora em que seremos novamente plural. E tudo o que já passamos e o que ainda passaremos confirmará cedo ou tarde que não mais vivemos um sem o outro.

Enquanto as maçãs crescem lá fora

Tenho um vinho antigo esperando por você no meu porão. Acredite, as melhores músicas ainda são segredo e os bons diálogos ainda estão latentes. Deixei uma árvore crescendo ali fora, meu amor. Logo você terá as belas maçãs que eu cuido carinhosamente enquanto crescem. Nossa vida será serena quando precisarmos de paz. Mas também terá dias agitados quando tudo o que desejarmos é viver como jovens perdidos no tempo. Serei sempre sua cumplice dos crimes mais perfeitos. Serei sempre a mulher que deseja, da forma que deseja. Surpresas não serão surpresas apenas, mas delícias do nosso cotidiano. Eu estarei sempre em vestidos de vida e você com sorrisos arrebatadores, tudo com encaixe perfeito, na medida exata da nossa felicidade.

Nova brisa

Doces em caldas quentes e suculentas envolvem você e eu. Sabores antigos e novos se misturam e nos confortam com sorrisos e olhares que pareciam mortos. Vejo leve sua alma a tocar na minha. Sinto fresco o vento que entra pela nossa janela trazendo cheiro de vida nova e alegria. O segredo para tanta harmonia sempre foi equilíbrio. E agora estamos nessa gangorra, descendo e subindo com os dias que nos restam. Podem ser os últimos ou os primeiros. Tudo depende de como ainda podemos ser crianças e aprender um com o outro.

Razão e nostalgia

Aqui me renovo em velhos sorrisos.
Me volta o ar que havia escapado.
Os lábios não anseiam por mais nada.
Seguem meus movimentos lentos e prazerosos.
Meus cabelos vão novamente mudar de cor, eu sinto.
O tempero está mais suave e o cheiro convidativo.
Nada de medos ou fantasmas essa noite.
Só o embalo das cobertas e de uma música antiga.
Aconteceu algo de diferente.
Senti o gosto leve da vida.
Eu vejo mais estrelas, avenidas e luzes.
Uma cidade construída para os meus desejos.
Nela vou me perder e me encontrar a cada noite.
Viver de brisa com a malícia antiga e a curiosidade do novo.

Vida nova

Deslizo os olhos pelo tempo, não encontro os erros e nem onde comecei a me perder. Agora vejo minhas coisas arrumadas. Vou pegar o último trem. Passos desconhecidos por todos os lados. Vozes que ecoam palavras que não compreendo. Encaro um presente que se desfaz. Respiro uma vida que nasce cheia de expectativas. Meu coração fica guardado naquela cidade que me viu crescer. Meus pés pisarão firme em qualquer chão. Deixo tudo para trás já que alguém quis assim. Esse alguém não sabe onde, não sabe quando, mas sabe que me conheceu e vai pra sempre se lembrar disso.

A noite e a dama

Tiro certeiro. Sem mais reflexões vagas ou postura ereta. Hoje a noite as luzes cegarão a todos. Os carros romperão a barreira do som. Os semáforos não housarão o vermelho. Seus saltos estarão mais firmes e martelarão o coração de quem estiver desatento. Com o gosto do pecado nos lábios, ela estará na sua melhor forma. Sua taça rebolará lenta com venenos. Não confunda beijos com promessas. Neles a noite se fundirá. Lentos e prazeros. Tudo começará inocente e pela manhã estará acabado assim como você.

Temporal

Assim seguem-se os dias. Mais escuros e caóticos. Sua voz penetra causando dor e narrando pesadelos. Suas palavras cortam afiadas e derramam o resto de vida que ainda me sobra. Vejo flores morrerem ao longo da estrada e nada posso fazer pra salvá-las. Tinta escura borra o céu que um dia foi decorado com estrelas e sonhos. A chuva ácida está prestes a cair e varrer essa terra que não é minha e muito menos sua. Estamos desabrigados à espera do mesmo temporal. Você vai me deixar morrer?

O fim da guerra

Finalmente a poeira começa a descer. Aparecem os primeiros feridos e tantos desabrigados. É o fim de uma batalha desnecessária. Não houve vencedor, apenas destruição e desespero. Os anjos choraram por dias o sangue das crianças inocentes. Os homens se ignoraram como semelhantes e destríram uns aos outros com satisfação. As mulheres viram seus filhos partirem antes delas e banharam salgado as vestes imundas. Algumas se armaram de coragem e partiram para o fim evidente. Assim foram dias e mais dias vermelhos e negros. Barulhos ensurdecedores e gritos. O terror em asas escuras e rondar esconderijos e pastos. Nada era seguro. Cada dia era um a menos para a decisão duvina. No fim resta tristeza e pouca esperança. Vidas alteradas e chão bruto para recomeçar. É preciso força e olhos cegos pra desconstruir o agora e construir o futuro.

Andarilho

De quantas linhas você precisa para compreender que sentimentos devem nascer e morrer, mas acima de tudo existir? Quantos versos você precisa ouvir pra compreender que amor não se encontra em toda esquina? Já gastei todo o meu repertório e você ainda não se deu conta do final do show. Querido, acorde antes que seja tarde. A cidade inteira está indo dormir e só resta você querendo algo mais essa noite. É melhor ter um pouco mais de pressa, o toque de recolher já foi dado e você segue errante pelas ruas vazias. Não estou nos caminhos por onde você passa, não vou mais seguí-lo também. Contiue andarilho, sem destino, sem casa nem calor. Mas não venha bater em minha porta quando tudo o que eu for capaz de sentir não passar de pena.

Entre papéis e poeira

Fragmentando o tempo encontro você sempre de mãos atadas. Sei que costuma enaltecer situações, fazer rodeios e falar de nós como se eu fosse a fera. Porém, nunca estive com lâminas afiadas escondidas nas vestes, muito pelo contrário, sempre estive de mãos vazias esperando que as suas se ocupassem em segurá-las. Por tanto tempo não adiantei um passo na esperança de que você desse dois. Segui os dias fazendo questão de que fosse como eu imaginava, com fundo de romance e continuação quando as luzes se acendessem. Moldei o momento várias vezes e ensaiamos algumas inclusive. Porém, era preciso que eu deixasse nítido o que seria mais bonito ocultar. Sem coragem líquida eu sou apenas parte do cenário da sua vida. Foi assim e tem sido assim. Os anos entraram e saíram e eu me vi sempre cercada de mitos que fugiram dos seus pensamentos. A maioria deles invasivos e ofensivos. Nunca me importei com essas qualidades estranhas que soam como mistério e maldade. Mais uma vez, não tenho ações prontas para nossa situação, armada quase sempre com os mesmos elementos: gargalhadas, sorrisos, bem-estar e nostalgia. Esperei que com nossas vidas menos unidas você teria coragem. Mas novamente vejo que o fardo sou eu quem carrega e que esse abismo é fatal demais para você. Eu apenas gosto do perigo e do novo. Você segue cauteloso e continua estático e malicioso ao agir e falar do nosso mundo. Eu não sou nada do que você supõe e você não pretende ser o que eu apenas suponho. Deixemos as palavras de lado e também os sonhos. Tudo fica no papel, numa grande pilha de papéis na gaveta que nunca encontram a hora da publicação.

Envelhecimento a jato

Os músculos pedem descanço, a cabeça se recusa a ficar erguida. Dias acabam e começam e eu não sei como passei por cada um deles. Uma vida em branco me consumindo e me reduzindo a máquina. Já sem baterias volto ao que sou, humana. Nada quero além de boas horas de sono e nada marcado na agenda. Já não me lembro a última vez que tive tempo de me olhar no espelho e sei que não estou mais como antes, devo ter envelhecido muitos anos em algumas semanas.