Início do descomeço.

Enquanto caminhava a passos miúdos pela longa rua, tentava imaginar algo menos dolorido. Sustentava uma esperança de encontrá-lo ainda a meios lençóis. A linearidade dos postes a encomodava assim como aquelas grades molhadas. Tanta umidade, tanto vazio, tanta noite. Estava além do suportável tal cenário. A cabeça não ousava se abster do capuz. Aquele nostálgico gosto de alcool abalava seu estômago. Não ligava para os carros. Nem mesmo entendia a linguagem dos homens. Estava mais uma vez mergulhada no seu fluído, seu mundo perdido regado a sertralina. Conhecia aquela neblina. Tal ausência com mais gosto de saudade. Novamente os olhos estavam manchados assim como a razão. Ela se via abraçada com a abstinência, despencando dez andares dentro de si. Queria ser menina, sabia que era mulher. Precisava das palavras dele com a certeza de que odiaria escutá-las. Não era um bom dia para lições. A cada passo menos presença. Poças trêmulas pareciam dançar ao vento. Mas nada a dominava mais que seus devaneios. Como desejava vê-lo. Complicada revelação. Ela não era mais o bastante para si depois de conhecê-lo. Estava a metros de casa e a séculos da realidade. Concentrava-se em em equilibrar-se no meio fio a pobre Colombia. Carregava tanto peso que a brincadeira ia perdendo a graça. Já não queria um copo de leite quente para passar o frio, ficaria satisfeita com o dueto leite e chocolate somente. Deixava de ser singular. Perdia o Eu. Procuarava o Nós nos bueiros, no ar. Menina de pensamentos contráditorios, suculentos e as vezes amargos. Queria que como em outrora o meio fio a levasse aos lábios dele e não ao palco particular daquele momento. Precisava desligar os holofotes. Estava de frente para a desilusão. O vento mais forte anunciava mudanças ou talvez fosse apenas impressão. Os olhos estavam pequenos. Os pensamentos foram escoando um a um pelo ralo. Matou então a sonhadora, encontrou a sensata e abriu o portão.